REFORMA TRIBUTÁRIA E A ERA DA INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL: OS RISCOS DA FISCALIZAÇÃO ALGORÍTMICA
24 de setembro de 2025
A EC 132/23 introduziu uma profunda reestruturação no sistema tributário brasileiro, estabelecendo o IBS – Imposto sobre Bens e Serviços e a CBS – Contribuição sobre Bens e Serviços, com o objetivo de simplificar a tributação sobre o consumo. Essa reforma exige uma integração massiva de dados fiscais, criando um ambiente propício para a utilização de IA – inteligência artificial na fiscalização tributária.
A RFB – Receita Federal do Brasil tem implementado ferramentas baseadas em IA para aprimorar a detecção de fraudes tributárias e aduaneiras. Como exemplo, podemos citar o desenvolvimento pela RFB de uma plataforma inovadora capaz de ampliar a detecção de irregularidades tributárias na importação, identificando inconsistências em lançamentos contábeis ou divergências em valores declarados, permitindo correções antes de uma possível auditoria. Além disso, a RFB utiliza IA para gerar relatórios de auditoria mais rápidos, precisos e estratégicos, identificando padrões atípicos que passariam despercebidos na fiscalização tradicional.
O uso de IA na fiscalização tributária levanta questões jurídicas complexas. Autuações baseadas em algoritmos podem colidir com princípios constitucionais, como o devido processo legal, contraditório e ampla defesa. A decisão automatizada é menos transparente, e a explicação das razões que levaram à autuação nem sempre é clara ao contribuinte. O risco é a ocorrência de erros ou vieses nos modelos de IA, que podem gerar litígios de massa, questionando a validade das autuações e a responsabilidade do Fisco.
A jurisprudência recente do STJ tem abordado a questão da transparência na motivação dos atos administrativos. Em decisões como o REsp 1.907.044/GO, o tribunal enfatizou a necessidade de motivação clara e suficiente nos atos administrativos, o que inclui as autuações fiscais. A aplicação de IA na fiscalização deve, portanto, respeitar esse entendimento, garantindo que os contribuintes possam compreender as razões pelas quais foram autuados.
O PL 2.338/23, em tramitação no Congresso Nacional, visa estabelecer normas gerais para o desenvolvimento, implementação e uso responsável de sistemas de IA no Brasil. O PL propõe uma regulação baseada em risco, semelhante ao modelo adotado pela União Europeia, e enfatiza a importância da transparência, responsabilidade e supervisão humana nos sistemas de IA.
No contexto tributário, a regulamentação será essencial para equilibrar eficiência arrecadatória e proteção de direitos fundamentais, prevenindo abusos e insegurança jurídica. A proposta de regulação da IA deve ser acompanhada de perto, pois suas implicações podem afetar diretamente a relação entre Fisco e contribuintes.
A adoção de IA na fiscalização representa um impacto direto no compliance corporativo. Empresas precisarão investir em sistemas internos de monitoramento fiscal, auditoria de dados e governança digital, sob pena de sofrer autuações potencialmente contestáveis. Por outro lado, a inteligência artificial pode reduzir custos do fisco e acelerar a resolução de litígios, beneficiando contribuintes que mantêm a regularidade fiscal.
Especialistas sugerem que os sistemas inteligentes podem identificar padrões de comportamento que podem ser interpretados como infrações fiscais. Por exemplo, a IA pode sinalizar inconsistências em lançamentos contábeis ou divergências em valores declarados, permitindo correções antes de uma possível auditoria.
Para equilibrar eficiência fiscal, segurança jurídica e inovação tecnológica, três caminhos se destacam: transparência algorítmica, tornando públicos critérios gerais usados nos modelos de decisão, garantindo que contribuintes compreendam as regras do jogo; orientação administrativa vinculante, com portarias e instruções normativas claras da Receita Federal e PGFN para uniformizar a interpretação e reduzir margem de litígio; e controle judicial e revisão humana, assegurando que decisões automatizadas possam ser revisadas, garantindo que erros ou vieses sejam corrigidos sem prejuízo ao contribuinte.
A reforma tributária, ao mesmo tempo em que moderniza o sistema fiscal, inaugura uma era em que tecnologia e direito se cruzam de forma inédita. A utilização de inteligência artificial na fiscalização pode ser um divisor de águas na arrecadação, mas exige cautela. Se bem implementada, oferece maior eficiência e segurança jurídica; se mal aplicada, pode se transformar em fonte de litígios e questionamentos constitucionais em larga escala.
O desafio brasileiro é, portanto, equilibrar inovação tecnológica, justiça fiscal e proteção aos direitos fundamentais, criando um ambiente tributário moderno, seguro e confiável para contribuintes e Fisco.
Fonte: www.migalhas.com.br/
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